O vaidoso não olha para os seus semelhantes no intuito de
querer vê-los, por dentro, descobrir ou interessar-se por suas necessidades...
A despeito das inestimáveis conquistas científicas e
tecnológicas, o homem, este ser racional, ainda não aprendeu a conhecer a si
próprio e aos seus semelhantes. Ainda não aprendeu as lições básicas do amor. Do amor na
acepção ampla do termo. E por isso, o homem ainda não está em condições de ser
totalmente feliz, devido à falta de conhecimento do homem sobre ele mesmo. Nos
seus defeitos, que crescem em proporções geométricas, enquanto suas virtudes
andam a passos de tartaruga.
E um desses defeitos de personalidade, com certeza, é a
vaidade.
O homem vaidoso gosta das pessoas e das coisas quando essas
coisas e pessoas se transformam em verdadeiros espelhos; espelhos que refletem
a sua própria imagem. É a atração pelos espelhos. São os espelhos dos bares, das lojas, os vidros espelhados
que duplicam e embelezam as imagens que somente o vaidoso consegue enxergar.
Mas também há outros espelhos, por extensão do termo, em que
se mira o homem vaidoso. Os espelhos das opiniões a seu respeito. O espelho impresso, que traz o seu nome com destaque, em
meio a tantos outros, só o dele brilha mais, é visível. Seu nome gravado num CD, chamado pelo telefone, impresso na
revista, é de uma visão única, especial.
O vaidoso fica horas e horas contemplando aquele espetáculo,
aquela espécie de reconhecimento prévio que ele já esperava. Como soa bem seu nome ao telefone, escrito no envelope de
uma carta.
Quando o vaidoso escreve algo para o jornal, algum artigo,
diminuto que seja, é o bastante para ele ler e reler várias vezes o seu texto. Todo o brilho do jornal parece que ocupou apenas aqueles
centímetros quadrados da página onde consta seu texto com o seu nome.
O vaidoso não olha para os seus semelhantes no intuito de
querer vê-los, por dentro, descobrir ou interessar-se por suas necessidades.
Ele aguarda, apenas, o reconhecimento do próximo ao descobrir o que ele pensa a
seu respeito. Quando o vaidoso conversa com os outros, o assunto é sempre
acerca de si mesmo, de suas coisas, de suas ideias, de seu trabalho. Ele não consegue entender que haja coisa mais importante.
Quando o vaidoso chega numa festa ele percebe que o ambiente
mudou, para melhor. Foi a sua chegada, ou por causa dela, que o brilho do
ambiente modificou. Até então estava faltando alguma coisa de melhor. Ele sente
isso. Que o assunto vai melhorar. Que as pessoas, finalmente, vão aprender
alguma coisa com ele.
Vão admirá-lo. E ele não vê a hora de iniciar o espetáculo.
Eu, as minhas coisas, os meus problemas, as minhas
realizações.
Há pessoas que só parecem ver o seu próprio rosto. Não
conhece ninguém profundamente. Os pensamentos e as ideias dos outros não lhe
interessam, não fazem qualquer sentido. Seus pensamentos são muito mais
importantes, mais lógicos, guardam maior sentido. Maior profundidade.
O escritor e jornalista Gustavo Corção, em “Lições de
Abismo”, resume o perfil do vaidoso, segundo o qual: “todas as coisas, todas as opiniões, são como o espelho de
sua própria importância, da sua própria face, que para ele é a grande, a única
realidade, em torno da qual o mundo inteiro é uma imensa moldura”.
Já Rafael L. Fuentes, Doutor em Direito Canônico pela
Universidade de São Tomás de Roma, assim se expressa: “O deslumbramento do
vaidoso, essa espécie de elefantíase personalista que o coloca no centro do
universo – poderia encontrar uma imagem plástica na figura mitológica do
Narciso”.
Só para relembrar, Narciso era um jovem encantado com sua
própria beleza. Um dia, ao ver refletido o seu rosto nas águas de um lago,
sentiu-se tão atraído por si mesmo que ao tentar abraçar-se acabou morrendo
afogado.
E quanta gente não conhecemos que, ainda hoje, continua
afogado, asfixiado, extasiado, enamorado, enlouquecido pelo excessivo apreço e
admiração que sente por si mesmo.
(*) Extraído de um texto de Domingos Oliveira Medeiros
(poeta e escritor brasileiro, autor de centenas de textos entre artigos,
ensaios, crônicas e contos)
Fotos ilustrativas de divulgação da internet
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